sábado, 6 de julho de 2013

ORGÂNICO: "PERCEBI QUE OS CARAS QUE PRODUZIAM NÃO LEVAVAM PRA CASA PRA COMER!" - MARCOS PALMEIRA

 

Fazenda


Vista da fazenda Vale das Palmeiras em Teresopolis - RJ
A fazenda Vale das Palmeiras surgiu de um sonho de criança, no interior da Bahia, quando eu e o meu amigo Rildo, debaixo dos nossos 13 anos, firmamos um pacto: um dia teríamos um pedaço de chão juntos para que pudéssemos criar gado e cavalo. Em 1987, depois de muito procurarmos, me deparei com uma fazenda produtora de hortaliças em Teresópolis.
Vista da fazenda Vale das Palmeiras em Teresopolis - RJ
Decidi que ali seria o lugar para começarmos o sonho.
Adquiri a propriedade com todas as minhas economias e iniciamos ali o aprendizado sobre a importância de se produzir alimentos. Depois de um período inicial totalmente nos moldes convencionais, descobri que os produtores não comiam o que plantavam.
Então a ficha caiu: aquilo que colocavam no solo para “fortificá-lo” na verdade estava envenenando tanto o solo quanto quem se alimentava dos produtos. A partir daí radicalizei e proibi qualquer tipo de adubo químico, assim como os agrotóxicos. A questão agora era: como tornar aquela terra produtiva?

Marcos e Rildo
Foi aí que o Rildo conheceu um senhor mais maluco do que eu, como ele mesmo gostava de contar. Esse senhor falava com formiga!
E lá fui eu conhecer o sr. João Carlos Ávila, especialista em agricultura biodinâmica. Então descobri a importância da fertilidade do solo e entendi que ele não falava com as formigas, mas entendia a importância delas no equilíbrio do sistema.
A partir daí mudamos o nosso foco e descobrimos que não existe praga, mas sim desequilíbrio.
Começamos a investir no composto produzido dentro da fazenda, bem como as mudas, visando uma planta saudável e resistente. Mergulhamos no fantástico mundo da sustentabilidade, onde ficávamos cada vez mais independentes de insumos externos.
Começamos a produzir uma variedade enorme de hortaliças, chegando a 100 variedades. E investimos na preservação da mata existente com o intuito de aumentá-la através de reflorestamentos anuais com variedades nativas. Investimos na qualidade de vida e na capacitação dos funcionários Entramos no mercado do Rio de Janeiro com um produto de alta qualidade e que nos dava muito orgulho, afinal era a comida que queríamos para nossos filhos.
Fizemos contatos com parceiros importantes que nos ajudaram com troca de informações, entre eles a fazenda Malunga, do Joe Vale, em Brasília. Esse contato com outros produtores foi fundamental para o nosso crescimento. No final do ano 2000 aconteceu o inesperado. Rildo foi assassinado na entrada da fazenda quando chegava com o pagamento do mês.
Sofremos um baque quase irrecuperável, mas como diz minha avó: vida é movimento. Fomos à luta eu, Eleni, esposa do Rildo, e as duas filhas deles, Jêco e Jamile. Arregaçamos as mangas na luta para que aquele sonho não se perdesse.
Nossa transição para a produção orgânica se iniciou com o contato com João Carlos Ávila, que é um dos maiores especialistas em biodinâmica no Brasil e trabalha na Associação Biodinâmica, lá em Botucatu. Através de seu apoio e conselhos foi criado um plano de conversão da fazenda, que levou alguns meses e hoje já envolve 100% da produção, gerando produtos mais saudáveis e ao contrário do que se pensa muita economia em insumos e fertilizantes.
Após um início conturbado, com problemas de doenças e pouca produtividade, fomos nos ajustando e melhorando a mira.
Nossa visão mudou, paramos de olhar somente para as alfaces e começamos a olhar para a terra e sua qualidade, isso reflete diretamente na saúde do ecossistema e consequentemente nas plantas que cultivamos nele.
Além disso, temos a preocupação de respeitar todos os seres vivos presentes nestes ecossistemas.Um exemplo são as formigas e demais insetos que são vistos muitas vezes como destruidores de plantações. Para nós, elas simplesmente são seres em uma complexa cadeia trófica que precisam se alimentar também. A idéia é que possamos atrair os predadores naturais das “pragas”, preservando assim o ciclo da vida.
Passamos por várias crises, hoje temos uma fazenda que é uma realidade, onde todos respeitam a natureza, onde os animais vivem livres, com gado leiteiro orgânico (não consome antibióticos e se alimentam de orgânico), frutas, legumes e verduras produzidos dentro de um sistema integrado e sustentável.
Nosso queijeiro, Alvino, está na fazenda há dez anos. Ele começou como jardineiro e, depois de passar por quase todas as fases de produção da fazenda, se tornou mais um parceiro dentro do projeto. Nos preocupamos com a alimentação dos funcionários e, para isso, temos uma cozinha comunitária onde eles comem o que plantam e repõem a energia gasta no trabalho.
Tudo feito com muito carinho, sem estresse!
criancas de famílias moradoras da fazenda e vizinhos
criancas de famílias moradoras da fazenda e vizinhos
Agora fornecemos os produtos para o supermercado, feiras livres, lojas naturais e em domicílio.
Tudo num caminhãozinho refrigerado para que você possa comer em casa como se tivesse colhido na hora. Uma delícia!
Bem, esse é o início de uma história que começou com um sonho, sofreu uma tragédia, mas soube dar a volta por cima para se tornar uma realidade!
Continuamos sonhando que um dia viveremos num mundo sustentável.
Que a agroecologia se multiplique e que o Brasil se torne o maior celeiro de produtos orgânicos do mundo. O problema da fome é parecido com o do dinheiro. Não falta comida. Ela esta é mal distribuída, assim como o dinheiro. Estamos às ordens para dividirmos conhecimento e aprendermos mais com a vida e com as pessoas!
Como diz o poeta: sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só, mas sonho que se sonha junto é realidade!
Abraço,
Marcos Palmeira

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