Trem pagador
E-mails, agenda e depoimento de
secretária ao Ministério Público revelam como operava Jorge Fagali Neto,
o homem da propina no escândalo do Metrô de São Paulo
Alan Rodrigues, Pedro Marcondes de Moura e Sérgio Pardellas
Uma disputa travada na Justiça do
Trabalho revelou como opera um dos principais agentes do propinoduto
montado por empresas da área de transporte sobre trilhos em São Paulo
para drenar dinheiro público dos cofres da Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos (CPTM) e do Metrô paulista. Trata-se do consultor
Jorge Fagali Neto, indiciado pela Polícia Federal sob a acusação de
receber e intermediar o pagamento de propinas da multinacional francesa
Alstom a autoridades do PSDB paulista. ISTOÉ teve acesso ao depoimento
e a uma série de e-mails comprometedores entregues ao Ministério
Público, em junho de 2010, por sua ex-secretária Edna da Silva Flores. A
documentação deixa clara a proximidade de Fagali Neto com agentes
públicos e o seu interesse em contratos do Metrô paulista e da CPTM. Nas
mensagens, o consultor revela, por exemplo, preocupações com a obtenção
de empréstimos e financiamentos junto ao Banco Mundial (Bird), BNDES e
JBIC que viabilizem investimentos nas linhas 2 e 4 do Metrô paulista.
OPERADOR
Indiciado pela Polícia Federal, acusado de intermediar pagamento
de propina, Fagali Neto matinha frequentes contatos com
agentes públicos sobre obras do Metrô e da CPTM
O material entregue por Edna ao Ministério Público demonstra pela
primeira vez a ligação direta de Fagali Neto com os irmãos Teixeira,
Arthur e Sérgio, apontados como lobistas do esquema Siemens e
responsáveis por pagar propina a políticos por intermédio de offshores
no Uruguai, conforme revelou reportagem de ISTOÉ em julho. Em um trecho
de seu depoimento ao MP, Edna diz que os três mantinham “relacionamentos
empresariais” e “atuavam antes da assinatura de contratos” com o
governo de São Paulo. Copiados por Fagali em uma série de e-mails
envolvendo contratos com as estatais paulistas de transporte sobre
trilhos, os irmãos Teixeira também têm seus nomes citados na agenda
pessoal de Fagali Neto. Em uma das páginas da agenda, está registrado um
encontro com Sérgio Teixeira, hoje falecido, às 11 horas na alameda
Santos, no Jardim Paulista, região nobre de São Paulo. Em outra, constam
o telefone, o e-mail e o nome da secretária de Arthur Teixeira.
ELO ENTRE OS ESQUEMAS
Segundo depoimento de ex-secretária de Fagali Neto ao MP, ele atuava em
parceria com Arthur Teixeira (em destaque), apontado como lobista do esquema Siemens
A ex-funcionária narra também os cuidados do antigo chefe com
eventuais investigações. No período de 2006 a 2009, em que trabalhou
para Jorge Fagali Neto organizando o seu escritório, ele a mandava se
ausentar do seu gabinete quando precisava se reunir com clientes. Também
a pedido de Fagali Neto, ela comprou quatro celulares para que os
aparelhos fossem usados por ele apenas para tratar de negócios. O
consultor acreditava que assim dificultaria interceptações policiais. A
espécie de “faz tudo” da empresa era proibida até de mencionar ao
telefone os nomes de representantes de companhias às quais Fagali
prestava consultoria. Ela ainda recebeu orientação para se referir a
personagens do círculo de negócios do consultor por apelidos. José
Geraldo Villas Boas – também indiciado pela PF por ter participado do
esquema de corrupção – era chamado de “Geólogo”. O temor do consultor em
não deixar rastros era tão grande que ele fazia questão de pagar tudo
em espécie. “Ele sempre mantinha algumas quantias em local desconhecido
em sua casa”, disse. A ex-secretária afirma no depoimento que ele
costumava emitir, por meio da empresa BJG Consultoria e Planejamento
Ltda., notas de R$ 260 mil e R$ 180 mil, mesmo tendo apenas ela como
funcionária. Pelo jeito, dinheiro não faltava para o operador do esquema
do propinoduto tucano. Em 2009, o ex-secretário de Transportes
Metropolitanos de São Paulo (1994) e ex-diretor dos Correios (1997) na
gestão Fernando Henrique Cardoso teve uma conta atribuída a ele com mais
de R$ 10 milhões bloqueada por procuradores suíços. Procurado, o
advogado de Fagali Neto, Belisário dos Santos Jr., diz que os e-mails
foram obtidos pela ex-funcionária por meio de fraude junto ao provedor.
Ele, no entanto, não quis se pronunciar sobre o teor das mensagens.
Apesar das tentativas de Fagali de manter a discrição, segundo sua
ex-secretária, o elo do homem da propina no escândalo do Metrô com
agentes públicos ligados ao PSDB é irrefutável. Em 2006, Fagali trocou
mensagens e recebeu planilhas por e-mail de Pedro Benvenuto, então
coordenador de gestão e planejamento da Secretaria de Transportes
Metropolitanos, órgão responsável pelas estatais. Entre o material
compartilhado, como revelou o jornal “Folha de S.Paulo” na última
semana, estavam as discussões sobre o Programa Integrado de Transportes
Urbanos do governo até 2012, que ainda não estava definido. Até a
quarta-feira 25, Pedro Benvenuto ocupava o cargo de secretário-executivo
do Conselho Gestor do Programa de PPPs (Parcerias Público-Privadas) do
governo de São Paulo, quando pediu demissão na esteira das denúncias.
Nenhum comentário:
Postar um comentário